quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Família Soprano (The Sopranos) Temporada 1, Episódio 1 - Piloto da Série (2)



                        TONY SOPRANO
                    (demonstrando raiva)
               O que aconteceu com o Gary Cooper? 
               O tipo forte e silencioso?


Sinopse
Tony Soprano procura uma psiquiatra depois de desmaiar na festa de aniversário do filho. Relutante para falar no começo, logo ele se solta e começa a falar sobre seu dia a dia estressante, sobre seu trabalho como "administrador de lixo", e sobre ser o chefe da máfia local. Das disputas internas de poder, dos rivais e da violência de seu trabalho, dos problemas familiares tão comuns, seus esforços em ser um homem bom e honesto e sobre a tristeza em ter visto os patinhos crescidos no seu quintal e na sua piscina aprenderem a voar e irem embora.


Direção: David Chase

Roteiro: David Chase

Elenco: Tony Soprano (James Gandolfini), Drª Jennifer Melfi (Lorraine Bracco), Carmela Soprano (Edie Falco), Corrado "Junior" Soprano (Dominic Chianese), Livia Soprano (Nancy Marchand), Christopher Moltisanti (Michael Imperioli), entre outros.


Muita coisa pode ser dita a respeito de "Família Soprano", desde a interpretação naturalista até a trilha sonora, mas como este é um blog de dramaturgia, vamos ao que interessa.


Agora que já vi todas as temporadas e conheço o arco dramático da série, para onde ela vai e o que acontece, sinto mais segurança para discorrer sobre o todo o texto. É claro que muitas lacunas surgirão no decorrer do seriado, mas muitas destas lacunas serão justamente o que irá preencher a suposta "falta de sentido" do último capítulo, mas isto é algo que irei falar em outro momento.


A princípio creio que um do problemas centrais da série é: o que é afinal ser homem nos dias de hoje? O que aconteceu com Gary Cooper? O tipo durão e reservado? O machão que topava qualquer parada, capaz de dizimar mais do que dois batalhões de alemães sozinho em Seargent York? Ou o Cary Grant de Only Angels Have Wings?


É justamente este o problemas que leva Tony Soprano a procurar ajuda psiquiátrica. Aqui temos então o nó da história. Como poderemos ver nos episódios posteriores, é justamente o fato de procurar a psicoterapia, - o que geralmente leva o indivíduo a adquirir mais conhecimento de si - um dos catalizadores que a motivar uma série de forças antagônicas contra Tony.


No que tange o autoconhecimento, iremos participar do seriado descobrindo quem Tony é, o que é mais importante, descobriremos isto junto com ele! E acompanharemos a jornada de Tony, semelhante a de Édipo, em busca da verdade a seu respeito.


Aqui temos um elemento importante. Afinal a forma como a Syuzhet organiza a trama adota um narrador, mas não uma narrador passivo, afinal, em diversos momentos, enquanto Tony narra sua história para a psiquiatra, o que nós vemos se desenrolando é justamente sua narrativa.


Esta estratégia, brilhantemente utilizada aqui não é novidade, poderia citar dezenas de filmes que a utilizam, desde A Testemunha de Acusação (Witness to Prossecution) de Billy Wilder, A Malvada (All About Eve) de Joseph L. Mankiewicz (Não confundir com o irmão dele, Herman J. Mankiewikcz que é o roteirista de Cidadão Kane), ou em filmes não tão antigos, como Entrevista com o Vampiro.


Em Witness to Prossecution, o que nos é apresentado é a narrativa de Leonard Vole (Tyrone Power) a respeito de sua história, de como conheceu Christine Vole(Marlene Dietrich) e de que é inocente de um crime. Esta narração é feita a Sir Wilfrid Robarts(Excepcionalmente interpretado por Charles Laughton), sendo que o que nos interessa é o fato de Sir Wilfrid Robarts ser um advogado. Um advogado que estuda o caso de Leonard para defendê-lo de um crime o qual Leonard afirma não ter cometido. Ou seja, narrativa diz respeito a Leonard contando os "fatos" para o seu advogado de defesa.

Em A Malvada (All About Eve), temos acesso à fábula devido ao uso da narrativa feita por Addison De Witt (George Sanders), sendo que o que legitima a opção pela narração, é o fato de De Witt ser simplesmente um crítico teatral, fato que ele apresenta em suas primeiras palavras.

Em Entrevista com o Vampiro também temos um narrador, e quem a realiza é Louis (Brad Pitt), o que há de interessante aqui é que a entrevista é feita para um jornalista, Daniel Maloy (Christian Slater).

Assim, o que temos são três interlocutores dos protagonistas que são profissionais que trabalham, de certo modo, com informação, e buscam informação sobre o protagonista ou aquele que fala e/ou conhece o protagonista. 

No caso de "The Sopranos", a interlocutora, ou seja, para quem o protagonista irá narrar a história, é uma psiquiatra, alguém que não irá apenas ouvir ou nos contar quem é o protagonista, mas que irá guiar o herói na sua jornada de auto-conhecimento e em transformação o que dá uma gigantesca dimensão ao personagem. Sabiamente, quando David Chase ofereceu o papel de Carmela Soprano a Lorraine Bracco, ela simplesmente recusou pediu o papel da psiquiatra por ser muito mais desafiador.

Então resumindo a ópera, podemos dizer que não é uma inovação utilizar um interlocutor para o protagonista para que ele conte sua história, isto é tão velho quanto a roda! O difícil é conseguir um interlocutor ativo, ou pior, não dar nenhum interlocutor ao protagonista e deixa-lo falando sozinho como um idiota auto-centrado.

Ainda no que diz respeito à narração, temos no piloto da série um grande momento. Quando a psiquiatra, prevendo que Tony iria lhe contar algo muito barra pesada, já estabelece alguns limites na relação entre ambos, dizendo que qualquer coisa dita por Tony, que configure um homicídio ou alguém tenha se machucado, ela será obrigada a se reportar às autoridades. Isso acontece quando Tony começa a falar sobre uma cobrança que ele e seu sobrinho iriam fazer. Quando ela diz isto, tomamos um banho de água fria e pensamos "Ferrou tudo, só vamos ficar ouvindo este cara se lamentar e chorar por causa dos seus problemas", mas o que acontece?

O que aparece como um problema para o roteirista é visto como  um desafio e resolvido da melhor maneira possível. Tony diz para a psiquiatra que ele e seu devedor foram apenas tomar um café e que tudo ficou resolvido da melhor maneira possível. E então vemos Tony quebrar a perna do devedor e ainda dar vários socos na perna machucada e no rosto.

Posso não estar muito certo do que vou dizer, mas isto ajuda e muito a estabelecer empatia com Tony Soprano, pois ficamos íntimos do mesmo, mais íntimos do que sua própria psiquiatra, pois sabemos que iremos compartilhar com ele seus segredos.

Bem, acho que pelo primeiro episódio é melhor eu parar por aqui.

Até o segundo episódio.




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